sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Planejamento urbano e regional na internet - algumas fontes brasileiras

Um post rápido, apenas para listar algumas fontes de pesquisa de artigos e estudos acadêmicos na área de Planejamento Urbano e Regional:

  1. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais (RBEUR). Publicação da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional: http://anpur.org.br/revistas
  2. Metrodata. Bancos de dados com informações socioeconômicas e indicadores de análise social produzidos e desenvolvidos pelo Observatório das Metrópoles e por outras instituições: http://observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_content&view=article&id=152&Itemid=73
  3. Revista Cadernos Metrópole. Publicação do Observatório das Metrópoles, tem como principal objetivo difundir os resultados da análise comparativa entre as metrópoles brasileiras: http://www.cadernosmetropole.net/ 
  4. eMetropolis. Revista Eletrônica de Estudos Urbanos e Regionais: http://www.emetropolis.net/
  5. Urbe. A revista eletrônica da PUC do Paraná, dedicada à discussão de diversos assuntos e pontos de vista relacionados às questões urbanas em geral, e à gestão urbana em específico: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issues&pid=2175-3369&lng=pt&nrm=iso
Boa leitura!

Estatuto da Metrópole: um resumo

No dia 12/1/2015 foi sancionada a Lei Nº 13.089, que institui o chamado Estatuto da Metrópole, alterando alguns dispositivos da Lei no 10.257/2001 (o Estatuto das Cidades), e dá outras providências.
A lei é estruturada em seis capítulos: (I) Disposições Preliminares; (II) Da Instituição de Regiões Metropolitanas e de Aglomerações Urbanas; (III) Da Governança Interfederativa de Regiões Metropolitanas e de Aglomerações Urbanas; (IV) Dos Instrumentos de Desenvolvimento Urbano Integrado; (V) Da Atuação da União e (VI) Disposições Finais.
No Capítulo I (Disposições Preliminares) são apresentados (Art. 1º) os princípios gerais – no que consiste, objetivos e âmbito de aplicação (Regiões Metropolitanas[1], Aglomerações Urbanas e Microrregiões instituídas pelos Estados) – e também as definições fundamentais utilizadas pela Lei (Art. 2º), ou seja:
  • Aglomeração urbana: unidade territorial urbana constituída pelo agrupamento de 2 (dois) ou mais municípios limítrofes, caracterizada por complementaridade funcional e integração das dinâmicas geográficas, ambientais, políticas e socioeconômicas; 
  • Função pública de interesse comum: política pública ou ação nela inserida cuja realização por parte de um Município, isoladamente, seja inviável ou cause impacto em Municípios limítrofes;
  • Gestão Plena: condição de região metropolitana ou de aglomeração urbana que possui: formalização e delimitação mediante lei complementar estadual; estrutura de governança interfederativa própria, nos termos do art. 8o desta Lei; e Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado aprovado mediante lei estadual;
  • Governança Interfederativa: compartilhamento de responsabilidades e ações entre entes da Federação em termos de organização, planejamento e execução de funções públicas de interesse comum; 
  • Metrópole: espaço urbano com continuidade territorial que, em razão de sua população e relevância política e socioeconômica, tem influência nacional ou sobre uma região que configure, no mínimo, a área de influência de uma capital regional, conforme os critérios adotados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE[2]
  • Região Metropolitana: aglomeração urbana que configure uma metrópole;
  • Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado: instrumento que estabelece, com base em processo permanente de planejamento, as diretrizes para o desenvolvimento urbano da Região Metropolitana ou da Aglomeração Urbana; 
A instituição de Regiões Metropolitanas e de Aglomerações Urbanas (Capítulo II) é atribuição conferida aos Estados (Art. 3º), mas a governança dessas áreas deve incluir, de forma interfederativa, também os municípios que integrarem essas regiões. Quando uma Região Metropolitana ou Aglomeração Urbana envolver municípios de mais de um Estado, deve ser aprovada lei complementar em cada um dos Estados envolvidos (Art. 4º). Essas leis devem ter conteúdos mínimos, conforme definido no Art. 5º:
  1. Municípios que integram a unidade territorial urbana; 
  2. As funções públicas de interesse comum que justificam sua instituição; 
  3. A estrutura de governança interfederativa, incluindo a organização administrativa e o sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas; e 
  4. Os meios de controle social da organização, do planejamento e da execução de funções públicas de interesse comum. 
O Capítulo III, que trata da governança interfederativa, estabelece seus princípios fundamentais (Art. 6º[3]) e diretrizes específicas (Art. 7º). Nesses artigos, destaca-se a complementaridade estabelecida com o Estatuto da Cidade (Lei no 10.257/2001), especialmente no que diz respeito à gestão democrática das cidades. Nas diretrizes específicas, são estabelecidas obrigações para a governança interfederativa, que incluem a implantação de processo permanente e compartilhado de planejamento e de tomada de decisão; o estabelecimento de meios compartilhados de organização administrativa; o estabelecimento de sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas; a execução compartilhada das funções públicas de interesse comum, mediante rateio de custos; a participação de representantes da sociedade civil nos processos de planejamento e de tomada de decisão, no acompanhamento da prestação de serviços e na realização de obras afetas às funções públicas de interesse comum; compatibilização dos planos plurianuais, leis de diretrizes orçamentárias e orçamentos anuais dos entes envolvidos na governança interfederativa; e a compensação por serviços ambientais ou outros serviços prestados pelo Município à unidade territorial urbana. Essas diretrizes, além de reforçar o caráter democrático da gestão urbano-regional, tem efeito condicionador das políticas municipais (e das estaduais em relação a esses territórios), especialmente por vincular receitas e o planejamento orçamentário das entidades que compõem a unidade territorial. A estrutura básica da governança interfederativa das regiões metropolitanas e das aglomerações urbanas compreenderá em sua estrutura básica é descrita no Artigo 8º (instância executiva composta pelos representantes do Poder Executivo dos entes federativos integrantes; instância colegiada deliberativa com representação da sociedade civil; organização pública com funções técnico-consultivas; e sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas).
Os instrumentos de desenvolvimento urbano integrado são objeto do Capítulo IV, e incluem os seguintes (podendo haver outros, e sem prejuízo dos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade):
  1. Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado; 
  2. Planos Setoriais Interfederativos; 
  3. Fundos Públicos;
  4. Operações Urbanas Consorciadas Interfederativas; 
  5. Zonas para aplicação compartilhada dos instrumentos urbanísticos previstos no Estatuto da Cidade; 
  6. Consórcios Públicos; 
  7. Convênios de Cooperação; 
  8. Contratos de Gestão; 
  9. Compensação por Serviços Ambientais ou outros serviços prestados pelo Município à unidade territorial urbana; 
  10. Parcerias Público-Privadas Interfederativas. 
Embora sejam elencados dez instrumentos, é o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (doravante citado pela sigla PDUI) que constitui o cerne da política metropolitana estabelecida por este Estatuto, sendo o único instrumento detalhado pela lei. No Art. 10 se define que o PDUI deve ser aprovado mediante lei estadual, não substituindo os Planos Diretores municipais, mas condicionando este à necessidade de compatibilização. O Art. 11 estabelece que, assim como os Planos Diretores municipais, o PDUI deverá ser revisto, pelo menos, a cada 10 (dez) anos. O conteúdo mínimo do PDUI é definido no Art. 12:
  1. Diretrizes para as funções públicas de interesse comum, incluindo projetos estratégicos e ações prioritárias para investimentos; 
  2. Macrozoneamento da unidade territorial urbana; 
  3. Diretrizes quanto à articulação dos Municípios no parcelamento, uso e ocupação no solo urbano; 
  4. Diretrizes quanto à articulação intersetorial das políticas públicas afetas à unidade territorial urbana;
  5. Delimitação das áreas com restrições à urbanização visando à proteção do patrimônio ambiental ou cultural, bem como das áreas sujeitas a controle especial pelo risco de desastres naturais, se existirem; e
  6. Sistema de acompanhamento e controle de suas disposições. 
A atuação da União (Capítulo V) consiste no apoio ao desenvolvimento urbano integrado, conforme diretrizes e objetivos do plano plurianual e outras leis orçamentárias (Art. 13), tendo como requisito que a unidade territorial urbana possua gestão plena (Art. 14 – vide definição no Art. 2º). Como atribuição específica da União, o Art. 16 estabelece a responsabilidade por ações voltadas à integração entre cidades gêmeas localizadas na faixa de fronteira com outros países, especialmente com relação à mobilidade urbana.
Dentre as disposições finais (Capítulo VI), é estabelecida a criação de um Sistema Nacional de Desenvolvimento Urbano – SNDU (Art. 20), que deverá contar com a participação da sociedade civil, e incluirá um subsistema de planejamento e informações metropolitanas, coordenado pela União e com a participação dos Governos estaduais e municipais, na forma do regulamento. Esse subsistema reunirá, preferencialmente de forma georreferenciada, dados estatísticos, cartográficos, ambientais, geológicos e outros relevantes para o planejamento, a gestão e a execução das funções públicas de interesse comum em regiões metropolitanas e em aglomerações urbanas.
O Art. 21 define as responsabilidades dos gestores públicos com relação à implantação das exigências previstas neste Estatuto, caracterizando como improbidade administrative a não observância de algumas dessas responsabilidades. Entre elas, a de elaborar e aprovar, no prazo de 3 (três) anos, o PDUI das regiões metropolitanas ou das aglomerações urbanas instituídas até a data de entrada em vigor desta Lei mediante lei complementar estadual. Conforme o Art. 23, os Municípios podem formalizar convênios de cooperação e constituir consórcios públicos, independentemente das disposições desta Lei. Por fim, a lei acrescenta um item ao Estatuto da Cidade (Art. 34A), que passa a vigorar com o seguinte texto:
“Art. 34A. Nas regiões metropolitanas ou nas aglomerações urbanas instituídas por lei complementar estadual, poderão ser realizadas operações urbanas consorciadas interfederativas, aprovadas por leis estaduais específicas.
O texto original do Estatuto da Metrópole pode ser acessado nos seguintes endereços eletrônicos:

[1] No Brasil, existem as seguintes regiões metropolitanas, até o presente: (Alagoas) RM de Maceió, RM do Agreste; (Amapá) RM de Macapá; (Amazonas) RM de Manaus; (Bahia) RM de Salvador; (Ceará) RM de Fortaleza, RM do Cariri; (Espírito Santo) RM de Vitória; (Goiás) RM de Goiânia; (Maranhão) RM de São Luís,
RM do Sudoeste Maranhense; (Mato Grosso) RM do Vale do Rio Cuiabá; (Minas Gerais) RM de Belo Horizonte,
RM do Vale do Aço; (Pará) RM de Belém; (Paraíba) RM de João Pessoa, RM de Campina Grande; (Paraná) RM de Curitiba, RM de Londrina, RM de Maringá; (Pernambuco) RM do Recife; (Rio de Janeiro) RM do Rio de Janeiro; (Rio Grande do Norte) RM de Natal; (Rio Grande do Sul) RM de Porto Alegre; (Santa Catarina) RM do Norte/Nordeste Catarinense, RM de Florianópolis, RM do Vale do Itajaí; (São Paulo) RM de São Paulo, RM de Campinas, RM da Baixada Santista; (Sergipe) RM de Aracaju.
[2] O IBGE define como Capital Regional os centros que, como as metrópoles, também se relacionam com o estrato superior da rede urbana. Com capacidade de gestão no nível imediatamente inferior ao das metrópoles, têm área de influência de âmbito regional, sendo referidas como destino, para um conjunto de atividades, por grande número de municípios. Este nível tem três subdivisões: Capital regional A (11 cidades, com medianas de 955 mil habitantes); Capital regional B (20 cidades, com medianas de 435 mil habitantes); Capital regional C (39 cidades com medianas de 250 mil habitantes).
[3] Tais como: prevalência do interesse comum sobre o local; compartilhamento de responsabilidades para a promoção do desenvolvimento urbano integrado; autonomia dos entes da Federação; observância das peculiaridades regionais e locais; efetividade no uso dos recursos públicos e busca do desenvolvimento sustentável.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Qual o melhor fim para o Minhocão?

[Prescrição ao leitor: este artigo não tem nenhuma pretensão acadêmica. É um texto de intervenção, uma opinião escrita. Muitos dos argumentos mereceriam maior desenvolvimento, e muitas afirmações deveriam ser acompanhadas de fontes e referências. Não o são porque isso tornaria o texto extenso demais para uma postagem de blog. Convido todos a deixarem seus comentários, e assim podemos levar a discussão adiante. Há muito o que debater, mas tenho muito mais a dizer em defesa do que proponho aqui do que permitiria este espaço.]
  1. Símbolo máximo do urbanismo rodoviarista de São Paulo (descontando-se o óbvio "Plano de Avenidas" de Prestes Maia, que de fato estabeleceu o modelo para tudo o que lhe seguiu), a via expressa denominada oficialmente Elevado Costa e Silva, ou simplesmente o "Minhocão", está com os dias contados. Pelo menos no que diz respeito à sua função original e primordial: o de servir de via expressa para os automóveis atravessarem a cidade de São Paulo entre as zonas Oeste e Leste, cruzando o Centro.
  2. Há muito tempo são conhecidos os impactos que a intervenção, executada pelo então prefeito Paulo Maluf (início dos anos 1970, auge dos "anos de chumbo" da ditadura civil-militar), provocou no entorno: depreciação dos imóveis lindeiros, esvaziamento da região, deterioração paisagística e aumento da insegurança embaixo do Elevado, em toda sua extensão. O ganho foi unicamente para o transporte automotivo individual (ônibus não circulam sobre o Minhocão). E, assim mesmo, essa única vantagem justificou sua permanência por quatro décadas: sabemos que os direitos dos automóveis são inquestionáveis nesta cidade.
  3. Eram. Nos últimos anos, a pressão de moradores dos prédios em volta do Minhocão garantiu-lhes o direito ao silêncio com a desativação do tráfego em horários de baixo fluxo: noites, fins de semana a partir de sábado à tarde... No mesmo contexto, cresceu uma articulação social em defesa de outros modos de transporte que não o automóvel particular: movimentos em defesa do transporte público, da bicicleta, entre os principais. E, há pouco mais de uma década, vem florescendo em São Paulo uma nova cultura que reivindica a recuperação e reocupação dos espaços públicos na cidade. Festividades de rua, desde o êxito da Virada Cultural até o crescimento dos desfiles de blocos de carnaval. A cidade parece desejar a retomada de espaços que haviam se convertido em áreas monofuncionais dedicadas apenas ao carro.
  4. É nesse quadro que ganha força a demanda pela desativação do Minhocão. No recém aprovado Plano Diretor, consta a diretriz de desativá-lo progressivamente, enquanto se decide sobre seu futuro. As alternativas postas: a demolição e a constituição de um parque suspenso, inspirado no High Line novaiorquino, ou na Promenade Plantée parisiense. Seria uma hipótese a ser avaliada, porém por razões ainda não muito claras, vem-se construindo um discurso que tenta fazer dessa possibilidade um consenso, uma unanimidade - que não existe, diga-se desde já. Políticos, empresários, ativistas, imprensa, subitamente se mostraram não apenas simpáticos à ideia de um parque suspenso no Minhocão, mas ativamente engajados em promover sua realização.
  5. A solução do parque esbarra em questões técnicas complicadas, a começar pelo próprio estado de deterioração da estrutura do Minhocão. Há quem diga que sua recuperação possa ser mais cara do que o também custoso processo de desmonte. Não seria um caso inédito: numerosos casos nos Estados Unidos (berço do rodoviarismo) têm demonstrado que o custo de manutenção dessas estruturas já é mais elevado do que sua demolição (e nem é preciso incluir nessa avaliação outras externalidades como a depreciação do valor imobiliário no seu entorno). Além disso, o projeto não resolve o problema urbanístico e social que é a área sob sua estrutura - escura, sufocada.
  6. Mas o mais estranho da maneira como o debate tem sido conduzido é a falsa polarização entre "progressistas" que desejam o parque e "retrógrados" que, supostamente, desejam que tudo permaneça como está. Sim, uma parcela ainda majoritária da população vê com desconfiança a desativação da via expressa e teme pelo impacto que isso terá no tráfego (ainda que, empiricamente, esteja-se demonstrando que muitas vezes o trânsito nas regiões restauradas até diminui). Mas opor-se ao parque não implica automaticamente defender o carro. Pelo contrário, clama-se pela remoção desta estrutura tão perniciosa para a cidade.
  7. Assim como se defende a realização de concursos de ideias para o parque (o que, a rigor, seria redundante, porque isso já foi feito), caberia igualmente um concurso de ideias para a resolução da paisagem urbana pós-Elevado naquela região. Se a demanda por um parque se mantiver, ele pode inclusive ser desenhado no lugar do Minhocão, e não sobre ele. Ideias há muitas, e gente competente para um projeto deste tipo não falta - aqui mesmo em São Paulo, para não dizer no resto do Brasil ou até internacionalmente, se isso for desejado.
  8. A proposta de um parque elevado só tem, de fato, uma vantagem real sobre todas as alternativas que requerem a demolição da via elevada: prazo. Sua implantação pode dar-se imediatamente, tão logo o tráfego de veículos seja interrompido. Isso é ótimo para quem já tem investido na área - aparentemente, o mercado imobiliário já está atento e atuante na área, e já se encontram anúncios de imóveis novos ou "retrofitados" que vendem a proximidade com o "futuro Parque Minhocão". É a esses interesses que serve a pressa em aprovar e implantar o parque suspenso. Os demais usuários das atividades de lazer no Minhocão estão sendo ludibriados com a ameaça de que, se isso não for feito, nada será. O imediatismo é uma vantagem para quem demonstra ceticismo em relação à nossa capacidade de realizar algo planejado em longo prazo.
  9. Mas será isso, de fato, uma vantagem? Não será, aqui, um caso do que a sabedoria popular define como "quem tem pressa come cru", ou "a pressa é inimiga da perfeição"? A melhor solução é preterida em favor da mais rápida? Em prol de uma solução imediata, perde-se a chance de realizar um projeto como São Paulo há muito não vê, algo capaz de reconfigurar a cidade, materializar novos paradigmas. Uma chance histórica que seria desperdiçada em favor de um arremedo, um remendo numa cicatriz que há muito sangra a cidade.
  10. "O parque já existe, só faltam as árvores", dizem. Não é verdade. Falta muito mais do que árvores: não há infraestrutura de apoio, não há pisos adequados, não há mobiliário... E tudo o que pode ser instalado ali caberia perfeitamente nos espaços livres que foram sacrificados ao carro com a construção do Minhocão.
  11. Por fim, há ainda os que defendem a demolição parcial. Que sobrevivessem trechos do Elevado para que se preservasse a "memória" desse equívoco. Como se isso fosse "ensinar" a população a não incorrer no mesmo erro outra vez. Mas que "memória" é essa que se quer preservar? Exemplos como os memoriais dedicados ao Holocausto ou aos regimes socialistas na Europa Oriental são sempre invocados, mas ao meu ver essa analogia é imprópria. O que é o Minhocão, senão apenas um equívoco urbanístico? A memória da ditadura está bem conservada em um museu como o Memorial da Resistência. A memória do rodoviarismo está mais que bem salvaguardada em todos os viadutos e avenidas de fundo de vale da cidade. A única coisa boa que o Elevado Costa e Silva produziu foi, de fato, sua alcunha. O "Parque Minhocão" não precisa ser suspenso, e se a população deseja um parque naquela região, que seja feito como se deve: no chão. 
  12. Respondendo, então, à questão proposta no título desta postagem, o melhor fim para o Minhocão é sua demolição integral, e a substituição da estrutura por uma ampla e profunda requalificação da área - das vias sob o Elevado, dos edifícios lindeiros, de todo o entorno imediato, e principalmente das áreas livres públicas (como a Praça Marechal Deodoro) que foram destruídas ou descaracterizadas pela estrutura suspensa. Restituir a cidade, retirar as sombras, respirar de novo: é isso que deve ser feito. O desejo já existe, só falta realizá-lo.