sábado, 26 de dezembro de 2015

Projetos de Intervenção Urbana (PIU): São Paulo inovando na intervenção pública sobre o espaço...

"[...] pela primeira vez, no Brasil, onde como disse o “nó da terra” é o principal problema a entravar a ação do Estado sobre o urbano, torna-se viável para o mesmo manejar a dinâmica fundiária na renovação de áreas urbanas específicas sujeitas a projetos de intervenção."

É comum vermos no exterior grandes projetos de renovação urbanística, promovidos sob o controle do Poder Público. Aqui, entretanto, bairros abandonados proliferam nas nossas cidades. A diferença está nas condições de manejo, por parte do Estado, da questão fundiária. Pela primeira vez no Brasil, uma…

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

SP lança portal que integra órgãos da prefeitura e dá transparência

Informação pública é democratização do conhecimento e possibilidade de maior e melhor participação da população nas decisões.

Serviço liga 152 bancos de dados das diversas secretarias, órgãos e departamentos do executivo municipal e elimina burocracia na busca de informações que agora passam a ser abertas

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Dia da Consciência Negra: dez espaços para se aprofundar na cultura afro

O dia 20 já passou, mas as dicas continuam ótimas. E a matéria tem uma pequena contribuição deste que vos escreve! 😉

Entre os séculos 19 e 20, a região da Barra Funda era ponto de parada de uma linha ferroviária. Depois do expediente, os trabalhadores responsáveis por carregar e descarregar os trens —a maioria deles negros— se juntavam para batucar. Nascia assim, no Largo da Banana, o samba paulista.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Nossas cidades não estão preparadas para a mobilidade dos idosos

Essa é uma questão que deverá receber cada vez mais atenção por parte das políticas públicas - a começar pelos projetos arquitetônicos, urbanísticos e planejamento urbano. A tendência de envelhecimento da população brasileira é uma realidade que precisamos encarar seriamente. Quanto mais cedo entendermos isso, menor será o nosso próprio sofrimento no futuro.

Envelhecimento da população é um fato que vem ocorrendo sem que a sociedade enfrente o assunto devidamente: faltam educação, ruas e calçadas adequadas e mais acessos

domingo, 18 de outubro de 2015

moradia é urgência. existe arquitetura em um assentamento informal?

"Definir o que é ou não é arquitetura deixa de ser o primordial, urgente é encontrar um meio de suprir as necessidades básicas da população."

O que você entende por arquitetura? Podemos enxergar um barraco em uma favela como parte da arquitetura de uma cidade? Será mesmo que demolir as moradias existentes e construir um edifício mais moderno e bonito poderia levar dignidade aos habitantes de uma favela? Foto utilizada em artigo do escrito…

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

metaspmsp.xlsx

Monitorando o Programa de Metas da Prefeitura (2013-2016). Metodologia: com base no ObservaSampa atualizado em junho de 2015, foram elencadas as 123 metas e o percentual de cumprimento de cada uma delas. Considerando 100% o cumprimento integral (100%) de todas elas, cada meta individualmente representa 0,8% das metas estabelecidas. Para cada meta, considerou-se a porcentagem de cumprimento de cada uma, conforme declarado pela própria prefeitura. Para avaliar a porcentagem de cumprimento do programa como um todo, portanto, atribuiu-se esse percentual ao 0,8% correspondente a cada meta, somando-se tudo ao final. Vale observar que há metas superadas (ultrapassando 100% de cumprimento), então também há metas que participam com mais do que o 0,8% que corresponde a cada uma. Resultado da avaliação: o programa está com 65,7% de cumprimento (quase dois terços). 32 metas (26%) foram integralmente atingidas ou superadas; 45 (36,6%) estão em andamento com mais de 50% cumpridas; as 46 restantes (37%) estão com menos de 50% da meta atingida. Faltando um ano e meio para o final do mandato atual, é improvável que o terço faltante seja cumprido: as metas com menos da metade de cumprimento teriam que ser executadas pelo menos no dobro da velocidade que foram até agora (2 anos e meio). Alguns cenários possíveis, apenas para efeito de estimativa: num cenário OTIMISTA, as metas com mais de 50% seriam concluídas, as com atendimento menor que 50% e maior que 20% chegariam a 50%, e as com menos de 20% dobrariam o índice atual - o índice total chegaria a 83,3% do programa. O cenário mais PESSIMISTA é que não houvesse mais nenhum incremento, ficando em 65,7% até o final do mandato. Discussão: o sistema de metas permite avaliar o desempenho de uma gestão, mas cabe discutir se é possível esperar 100% de cumprimento das metas de um plano. É certo que quanto mais próximo do total for alcançado, melhor é o desempenho da gestão. Mas esse brevíssimo estudo não contou com séries históricas ou "benchmarks" para avaliar se o Programa de Metas da Prefeitura de SP está acima, abaixo ou dentro do usual sob qualquer critério. Esperamos que esse primeiro exercício possa auxiliar esse debate e a aprimorar métodos e métricas para avaliação das gestões municipais. Agradeço a indicação de qualquer estudo que forneça os parâmetros que faltaram a esta avaliação sumária.

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sexta-feira, 9 de outubro de 2015

10 conselhos para elaborar um plano urbano

Porque você pode mudar o jogo.

Durante a elaboração de um novo plano urbano para Abbotsford (Canadá), o urbanista Brent Toderian, ex-chefe de planejamento urbano de Vancouver e...

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

A Bridge That Celebrates Pedestrians Opens In Copenhagen

Uma travessia de pedestres que leva em conta o passeio, a parada, a contemplação, e mesmo o conforto e segurança. Nada parecido com as mesquinhas passarelas que os engenheiros de transporte brasileiros constroem, quase como se fosse mero desencargo de consciência (e que, ironicamente, ainda têm coragem de chamar de "obras de arte". #cidadesparapessoas #pedestres

Designed by Studio Olafur Eliasson, and built by the non-profit charitable foundation Nordea-fonden, Cirkelbroen bridge is a gift to the city of Copenhagen to promote good living in Denmark.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Barra da Tijuca: a história de um projeto de cidade

O poder público associado aos interesses privados mais mesquinhos, com um único objetivo: trazer lucro para os especuladores. Interesse público, direito à cidade, inclusão social? Aham, Claudia, senta lá.

Especialista em planejamento urbano mostra como os Jogos Olímpicos ajudam a consolidar no bairro da Zona Oeste o modelo neoliberal de território

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Número de ciclistas aumentou com implantação de ciclovias na capital

Vejam os números: mais de 70% dos ciclistas afirmam usar a bicicleta pelo menos 5 vezes por semana - 40% começaram a pedalar há menos de um ano nas áreas central e intermediária da cidade - 62% pedalam mais de 5 km no principal deslocamento do dia - 40% aproximadamente ganham entre 0 e 2 salários mínimos, índice semelhante ao número de entrevistados que têm entre 25 e 34 anos. “Isso [o estudo] é prova de que o cicloativismo estava certo. A oferta de infraestrutura vai gerar demanda pela ciclovia. Então aqueles que criticavam democraticamente [não consigo deixar de notar uma ponta de ironia aqui...] dizendo que estavam sendo feitas ciclovias para ninguém vão ter que rever os seus conceitos, porque naquele dia era verdade e um ano depois já não é mais. Nós não podemos trabalhar com o planejamento da cidade de um dia. Nós temos que planejar a cidade para 10, 20 anos e é isso o que está sendo feito em São Paulo hoje”.


quarta-feira, 16 de setembro de 2015

BRASIL ÉTICO EXIGE PROJETO COMPLETO | CAU/BR

Você mandaria fazer uma casa sem ver o projeto? Compraria um carro imaginário? Então, por que os projetos de obras públicas urbanas podem ser feitos só pela metade? É o que pode acontecer com a Lei de Licitações que está sendo discutida no Congresso Nacional. Há um sério risco de a nova lei permitir que obras públicas sejam licitadas apenas com base em anteprojetos. Ou seja, desenhos iniciais que não especificam materiais, tecnologia, orçamento e cronograma. É como se as empreiteiras ganhassem um cheque em branco. Com isso, abre-se o caminho para aditivos de contrato, atrasos por conta de novas especificações e até a não conclusão da obra – tudo por falta de um projeto completo, que possui todos os detalhes técnicos necessários à construção. Só um projeto completo garante mais qualidade, maior controle de orçamentos, cumprimento de prazos e ética nas contratações das obras públicas. Um Brasil ético exige projeto completo. Assim é bom para as cidades, ótimo para as pessoas e excelente para todos.

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Lentidão cai 6% com velocidade menor em São Paulo, diz CET

Os jornais oposicionistas apelam para todo tipo de desculpa (em especial a onipresente "crise") para criticar a medida, que é amplamente conhecida em outros países e aplicada com sucesso em NY e Londres, entre outras. Precisamos parar de discutir políticas urbanas com o fígado, e achar que tudo o que uma gestão faz tem que estar errado apenas por ser do partido X ou Y.


sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Agora é Lei - Lei 15.686/15 Dia do Ciclista 07/07/15

No dia 07 de julho foi ao ar o programa "Agora é Lei", da TV Assembleia, discutindo as ciclovias na cidade de São Paulo. Eu sou um dos debatedores, juntamente com ativistas da ciclovia e divulgadores das questões de mobilidade urbana. Confiram!

O programa Agora e Lei dessa semana, com a apresentação do jornalista Mauro Frysman, traz especialistas para debater a lei que fez oficial na Capital o dia E...

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

http://ift.tt/1qlOiLk

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU) da Prefeitura de São Paulo publicou uma cartilha sobre a "função social da propriedade", tentando esclarecer uma série de instrumentos e diretrizes do Plano Diretor recém-aprovado. Apesar de ser voltado diretamente para São Paulo, ele pode ser útil para entender o próprio conceito que intitula a cartilha, e todos os instrumentos que o Estatuto da Cidade criou para garantir o cumprimento dessa "função social". Vale a pena conhecer, para quem atua na área, para quem quer se engajar na defesa de uma cidade melhor. Diria até que valeria a pena que muitos juízes e profissionais do direito se inteirassem melhor desse assunto, para que pudessem balancear melhor suas decisões.


quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Renata Falzoni

"Praças" que não são praças, mas apenas restos do sistema viário.

Praças Impossíveis: Elas existem, mas ninguém consegue acessá-las. Prefeitura diz que vai estudar os casos. Saiba mais: http://goo.gl/z1gf1g #bikeelegal #issomudaomundo #todomundopelabike

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Prefeitura de São Paulo estuda ampliar área de calçadas

Tenho dito isso há algum tempo: a questão é de se redesenhar as ruas de São Paulo. Os movimentos estão acontecendo, mas ainda de forma desarticulada: ciclovias, corredores de ônibus, redução de velocidade dos carros, agora calçadas. Há uma razão muito defensável nisso tudo, que é reduzir o privilégio dado aos carros, em favor de diversas outras formas de se deslocar e usufruir da rua. Mas o que falta é dizer que é preciso produzir DESENHO URBANO, projeto urbanístico para as vias. Um exemplo que eu vejo semanalmente: uma rua residencial próxima à faculdade onde leciono. A rua só comporta, de fato, uma faixa de "rolamento", em apenas um sentido. Carros só podem estacionar em um dos lados. Ainda assim, as dimensões da faixa de rolamento permitem que os carros trafeguem em alta velocidade, enquanto calçadas exíguas exigem dos pedestres, em muitos momentos, que caminhem fora delas. Bastaria, então: reduzir as dimensões da faixa de rolamento, permitindo alargamento das calçadas. Os pedestres circulariam melhor, o número de faixas não se alteraria mas os carros transitariam numa velocidade compatível com o tamanho daquela rua. É essa visão integrada que está faltando. De resto, a iniciativa merece todos os aplausos.


sexta-feira, 26 de junho de 2015

Como a demolição de vias expressas está revivendo as cidades americanas

Fonte: Removing Freeways - Restoring Cities (http://www.preservenet.com/freeways/FreewaysWestSide.html)
Parece um contrassenso, mas o que várias cidades americanas estão descobrindo é que a remoção de vias expressas (como o Minhocão de São Paulo) estão não apenas requalificando grandes porções de espaço urbano, que ganham parques, praças e outros usos coletivos, como estão também contribuindo para reduzir congestionamentos. Sim, isso mesmo: reduzindo congestionamentos. Na realidade, não é nada absurdo: o que essas vias fazem é aumentar não apenas a capacidade de fluxo, mas a sensação dos usuários de que há uma alternativa rápida. As vias expressas induzem tráfego, portanto. Sem essa alternativa, muitas opções se abrem: recorrer ao transporte público, buscar trajetos alternativos, e até avaliar a necessidade de realmente fazer a viagem. É preciso aprender com esses casos, e criar coragem para fazer isso em nossas cidades. A paisagem urbana só tem a ganhar, e os moradores das cidades idem.
Veja a entrevista com John Norquist, ex-prefeito de Milwaukee e atual presidente do Congresso do Novo Urbanismo aqui.

quarta-feira, 18 de março de 2015

Quando a multidão não faz um coletivo

Desde o século XIX, pelo menos, muitos observadores da vida urbana começaram a notar e revelar o assombro diante de uma cena corriqueira mas nem por isso menos assutadora: a aglomeração humana nas grandes capitais - primeiramente na Europa: Londres e Paris - produzia a imagem assustadora da multidão, da massa, um aglomerado de gente que ocupava os espaços da cidade como um "monstro" de forma indefinida (representado comumente por seus milhares de olhos e incontáveis braços e pernas) e praticamente incontrolável. O medo da multidão realçava a preocupação com as aglomerações que adquiriam expressão política: as massas em fúria eram capazes de derrubar reis, assim mostrara a França revolucionária.

Curiosa e paradoxalmente, um fenômeno tão significativo e intrigante quanto aquele também se fazia notar: os indivíduos que perambulavam pela cidade podiam perfeitamente experimentar uma sensação de profundo isolamento e enorme solidão. Sim, mesmo estando em meio à multidão. A massa humana, ao mesmo tempo que proporcionava a sensação de força coletiva, também garantia anonimato. Aprendeu-se, desde então, que a multidão não basta para fazer uma coletividade. E uma aglomeração muito grande poderia, em certos casos, produzir o efeito contrário: exacerbar o isolamento.

O que faz da multidão um coletivo é, tomando as reflexões de Lewis Mumford, um aspecto particularmente importante da vida urbana e dos espaços públicos: o diálogo. Os mais significativos espaços públicos urbanos da História são, caracteristicamente, espaços de encontro e interação - de fala e intercâmbio. Estou aqui pensando em ágora ateniense, forum romano, feiras medievais, etc.

As recentes passeatas brasileiras me lembraram dessas discussões, tão caras à reflexão urbanística. Sob a perspectiva do diálogo que anima a vida política (e aqui, mais do que nunca, vale investir na aproximação entre a ideia de cidade como aglomerado e como organização de uma coletividade, tal qual na raiz grega), o que se viu foi uma multidão, mas não necessariamente um coletivo. Foi, primordialmente, uma passeata de indivíduos se expressando politicamente como tais - manifestação, portanto, de acentuado teor individualista.

Individualismo

Não pretendo, ao dizer isso, desqualificar a manifestação nem lhe negar legitimidade. Ao dizer que é individualista, não estou afirmando que seja carente de qualquer sentido de coletivo. O termo "individualista" aqui não é sinônimo de "egoísta". Apenas serve para pontuar o fato de que o sentido de coletivo que a grande passeata de 15 de março é derivada de uma projeção do individual. "Individualismo" aqui é, portanto, um modelo de pensamento que tem no indivíduo seu referencial essencial e fundante.

Vários aspectos do protesto permitem demonstrar essa afirmação. A começar pelo objeto do protesto, o elemento que levou todas as pessoas às ruas: a oposição a um governo e um partido se cristalizou na oposição à figura (individual) de Dilma Rousseff. O mote do protesto, a corrupção, é percebida como a conduta desviante dos indivíduos em cargos públicos. A própria corrupção é, em si, um julgamento moral (individual), não político (coletivo): não era o projeto de reforma política que estava em questão, nem de fato a condução da economia, ainda que esses tenham fornecido motivação ao acontecimento. Era o comportamento de determinadas figuras públicas (poupando outras, diga-se de passagem): a questão, embora retratada como "sistêmica", não é enfrentada como sistema, mas como uma possibilidade de, trocando certas "peças", resolver o problema todo.

Uma outra dimensão desse individualismo é a dificuldade de mediação entre o particular e o universal. Passava-se rapidamente do "eu" para o "todos", sem estágios intermediários. Nas centenas de milhares de pessoas que protestaram no dia 15 de março, haviam proposições políticas muito diversas, que iam desde a defesa de uma reforma política, passando pelo impeachment, até os pedidos de golpe militar. Essa diferença seria profunda demais para unificar todos em uma única manifestação, exceto pelo fato de que os grupos diluíram suas próprias identidades em um discurso unificador da "defesa do país". Mesmo a acusação de corrupção não tem mediações: não há grupos de interesse, não há classes ou frações de classe: ou são pessoas corruptas ou são "todos corruptos".

Considerando que o país não está em guerra e nem sob ameaça de invasão, essa é uma identidade que faz pouco sentido, a não ser pelo fato de servir para apagar diferenças importantes. E para fabricar um inimigo: quem não apoiou essa manifestação era "contra o Brasil", ou era necessariamente a favor da corrupção ou do governo.

A falta de mediações explica porque é tão difícil argumentar que um governo pode ser alvo de críticas (e muitas) mas, assim mesmo, merecer o apoio em certo nível. E como a explicação tem que partir sempre do ponto de referência posto no indivíduo, esse apoio precisa ser explicado no nível individual: só apoia o governo quem "recebe bolsa", "participa de algum esquema", e a manifestação em apoio ao governo só é possível porque esses "receberam sanduíche e 35 reais".

Empreendedorismo

Infelizmente, as análises que vi pouco avançam no sentido de entender as raízes desse individualismo, e limitam-se a condená-lo (quem o critica) ou justificá-lo (quem o apoia). Proponho uma tentativa de entender esse fenômeno a partir da experiência histórica da redemocratização brasileira. Com isso, espero tentar escapar da estereotipia apressada, que tenta ver os manifestantes como simplesmente "fascistas", "golpistas" ou como uma "elite branca".

A história que quero contar aqui começa com a crise econômica brasileira do início dos anos 1980 - que coincidiu com a reabertura política. Recessão, desemprego e, em seguida, inflação. A maioria dos manifestantes de agora nasceu em torno dessa época, ou foi criado nela, e alguns passaram de fato por ela (nossos pais, por exemplo). Lembro de ter visto em algum lugar alguém que se referia a essa geração como a "geração do medo": medo do desemprego, medo de passar fome ou privações sérias, medo da violência e da criminalidade (que cresceram desde então - isso é outra discussão). Justificado ou não, o medo gera como reação a autodefesa. Alguns diriam, "instinto de sobrevivência". Na década seguinte, o controle da hiperinflação dos anos 80 resultou em ainda mais desemprego e, com a abertura econômica às importações e o "ajuste" neoliberal, muitos e muitos empregos foram extintos em nome de uma "flexibilização" das relações trabalhistas, das "terceirizações" (pessoas antigamente empregadas foram forçadas a constituir pequenas empresas e se tornarem "fornecedores", prestadores de serviço sujeitos às regras da concorrência comercial).

Enquanto o ajuste se processava, a imprensa, os "especialistas", a publicidade e até meios de comunicação "neutos" como as novelas, os quadrinhos ou o cinema se uniram na unificação de um discurso segundo o qual o melhor era que cada um fosse patrão de si mesmo, que o emprego estava fadado ao desaparecimento, e que portanto era fundamental que cada pessoa se tornasse um "empreendedor". O sucesso profissional é a medida da realização pessoal, e ele é resultado do esforço, empenho e mérito individuais ("Você S. A."...). Num ambiente economicamente hostil, as relações trabalhistas se organizaram em torno da disputa e da competição.

Nesse ambiente, a economia "terciarizada" (comércio e serviços) se sobrepôs à economia industrial, e assim também se enfraqueceu o modelo de organização do trabalho (e dos trabalhadores) característico dessa economia em crise. Os sindicatos perderam muito de seu poder de mobilização e pressão, e imensas parcelas dos novos trabalhadores se envolveram com ocupações novas, pouco ou mal regulamentadas, e com baixíssima sindicalização. Entre os extremos do "capital" e do "trabalho", formalmente organizados, articulados e representados nos partidos que emergiram da redemocratização (e que se cristalizaram na dicotomia PSDB x PT) formou-se uma imensa massa de trabalhadores que não se reconhecem como "proletários" ou "campesinos" e não partilham da experiência desses de solidariedade e representações coletivas em uma disputa política. E, embora também não sejam propriamente uma elite, alinharam-se ao discurso do "empreendedorismo" pessoal na esperança de alcançar a realização prometida. E não é mentira que muitos tenham conseguido.

Essa é a "classe média" que se manifestou no domingo 15/03 e hostilizou (e foi hostilizada por) pessoas que permaneceram alinhadas ao modelo de organização política herdada dos sindicatos. Essa "classe média" cresceu muito e foi amplamente favorecida pelas políticas inclusivas dos governos petistas, mas nem por isso se vê como resultado dessas políticas - e sim do esforço individual, de sua capacidade empreendedora. De seu "mérito", em resumo. O governo petista, entretanto, parece não ter sido capaz de perceber que, para essa parcela da população, o modelo de engajamento de tipo sindical (ou de movimentos sociais como MST/MTST ou os "conselhos populares") simplesmente não fazem sentido. A inclusão de uma parcela cada vez maior da população nessa classe média, em lugar de aumentar, fez diminuir a adesão às formas de organização social sindicalista. Talvez a única forma de articulação social que cresceu nesse período foi a de inspiração religiosa. Foi ela que permitiu a única mediação entre o individual (amplamente incentivado por essas igrejas) e o universal (ou nacional), propondo a mediação do "cristão", por exemplo. Daí a representatividade desproporcional, em relação ao total da população que os religiosos alcançaram no poder Legislativo.

Individualismo como ação política

Essa experiência histórica ajuda a compreender a adesão de parcelas tão vastas (e cada vez maiores) da população a um modelo de ativismo político a que as instituições mediadoras atuais já não respondem, sejam os sindicatos, sejam os partidos. E é possível que boa parte da oposição ao PT seja uma recusa do modelo de organização política que ele parece privilegiar: um reformismo inclusivo social e economicamente (e, sim, isso ainda se mantém), mas que não foi capaz de responder à ideologia do "empreendedorismo" individualista, por se manter fiel ao modelo de articulação sindical e a uma noção de coletivo baseada na partilha das experiências trabalhadoras do industrialismo. Não quero aqui julgar que posição está correta ou dizer que a proposta petista está "superada", "esgotada" ou "falida". Mas é preciso apontar para o fato de que as profundas mudanças na sociedade nos últimos 10 a 20 anos resultaram numa nova demanda para as articulações políticas. É preciso dialogar com mais proximidade e abertura com esses grupos sociais que não sabem, não conhecem e não demonstram particular inclinação para a organização coletiva de tipo sindical. E, que, no entanto, parece muito disposta a se engajar, sim. Ainda que de forma efêmera (em flashmobs) e sem "perturbar a ordem": as passeatas de domingo, horário de folga, parecem fazer muito mais sentido do que as de semana, que "atrapalham". Talvez porque o parâmetro individualista ensine que o importante é agir (se manifestar) e não necessariamente atingir (incomodar). Mas quem pode negar que, mesmo com motivações e por meios individualistas foi possível lograr uma grande mobilização, e esta se tornou um fato político absolutamente relevante? O difícil, portanto, não é reunir um milhão de pessoas (que seja: não vou entrar nessa briga de números neste momento). Há anos a "Marcha de Deus" e a "Parada LGBT" também o conseguem. O desafio é que essa "massa" transforme uma miríade de reivindicações diversas (e nem sempre coerentes) num discurso coeso e numa pauta concreta. Isso pode ocorrer (e, infelizmente para a esquerda, a destituição do governo petista parece se tornar esse discurso e essa pauta). Até porque, como ensinou o historiador E. P. Thompson, minorias articuladas emergem de dentro de maiorias inarticuladas (não o inverso, como acreditava o velho PC e, aparentemente, a cúpula do PT). Ao que parece, não é um movimento pequeno que se massifica: é uma ideia difusa que vai, pouco a pouco, mobilizando cada vez mais.

Daí que a disputa pela "ideia difusa" se torna importante. E neste sentido, as mídias têm sido espetacularmente bem sucedidas em promover a difusão de um "pensamento único", de um modelo de vida que se baseia no individualismo, no empreendedorismo competitivo - a tal ponto que as pessoas que aderem a esses valores chegam a perder a capacidade de vislumbrar outras possibilidades. Mas esse êxito não decorre apenas da ação dessas mídias: não acredito em mera doutrinação. Ela se vale da experiência de vida das pessoas, que parece corroborar agora o descontentamento com o governo atual, da mesma forma como, antes, levava ao apoio a esse mesmo governo: não porque a massa tivesse se tornado um coletivo, mas porque os indivíduos viam seu próprio êxito.

quarta-feira, 4 de março de 2015

A capital do fusca amarelo

Num artigo publicado hoje no jornal O Estado de São Paulo, o publicitário Roberto Duailibi se queixa de São Paulo ter-se tornado a "capital do grafite". Em sua diatribe indisfarçavelmente antipetista, o empresário se queixa da qualidade duvidosa dos grafites, de seu impacto - a seu ver, negativo - na paisagem da cidade, e acusa o grafite de ser uma forma de expressão "fascista".
Considerando que o próprio Duailibi reconhece não ser um crítico de arte, coisa que também não sou, vou desconsiderar suas opiniões a respeito da estética do grafite. Há pessoas muito mais qualificadas do que eu para falar sobre isso, a começar pelos próprios artistas, que poderiam falar sobre o processo de seleção, sobre suas escolhas artísticas, entre outras coisas. Já que o publicitário demonstra total desinteresse em uma discussão fundamentada, acho improdutivo tentar informá-lo sobre essas coisas. Mas seria bastante saudável que alguém, mais ligado à área atacada por ele, se manifestasse nesses aspectos. 
Aliás, em se tratando de pessoas mais qualificadas para um debate sério sobre o grafite, poderíamos trazer para a cidade e ouvir autores internacionais que têm se dedicado ao estudo das chamadas "artes urbanas" (urban arts), das quais o grafite é um exemplo importante. Seria uma ótima oportunidade para ouvir pessoalmente autores como Louis Bou, Lyman Chaffee, Francesca Gavin, Christian Hundertmark, Rod Palmer, Allan Schwartzman, só para citar alguns exemplos.
Posso falar mais sobre a sensação do publicitário de que os grafites "invadiram a cidade". É fato que São Paulo há muito tem seus muros e empenas cegas preenchidas pelas cores do grafite. Talvez o publicitário não desse atenção antes, e porque chamaram-lhe atenção para isso (a histeria em torno dos grafites nos "Arcos do Jânio" em seu círculo social talvez tenha contribuído) agora lhe pareça que há muito mais grafite do que antes. Não: há anos São Paulo é uma cidade fartamente grafitada. Isso me lembra uma ocasião, na adolescência, em que eu e amigos fizemos uma aposta envolvendo o número de fuscas amarelos que encontrássemos (supunha-se que não encontraríamos 50 naquele dia). Bastaram poucos quilômetros andando pela cidade para alcançarmos o número improvável. Tivemos, naquele dia, a nítida impressão de que São Paulo havia sido tomada de fuscas amarelos. Eles sempre estiveram lá, nós é que passamos a prestar atenção.
Assim como grafites, poderíamos dizer que, recentemente, São Paulo foi tomada por pontos de ônibus de gosto duvidoso, completamente disfuncionais (a cobertura, originalmente transparente, teve que ser rapidamente substituída por outra que - incrível - oferecesse sombra aos usuários do transporte público). Não sou crítico de arte, mas o desenho parece não ajudar muito a tornar o ponto mais agradável a quem espera pelos ônibus, assim dizem os usuários. Segundo alguns, ele inclusive torna a área protegida mais quente...
Da mesma forma, as ruas de São Paulo foram "invadidas" por relógios de rua, com indicações de temperatura, eventualmente de qualidade do ar. O desenho é questionável, por que não? Mas eu não sou crítico de arte para julgar.
Mas tanto no caso dos pontos de ônibus quanto dos relógios, eu também não me lembro de ter havido uma consulta à população sobre qual desenho era melhor, onde eles deveriam ser implantados (por que não começar pelos bairros periféricos, que sempre são relegados e recebem os equipamentos de pior qualidade?). Nem por isso vou dizer que pontos de ônibus e relógios de rua sejam "fascistas", mas me surpreende que o publicitário não se preocupe com a estética urbana nesses casos. Talvez porque não use ônibus. Talvez porque tanto um quanto outro tenham espaços generosos para a... publicidade. Aliás, por que nos pontos há tanto espaço para anúncios e sequer uma relação das linhas que os atendem?
O problema todo, ao fim e ao cabo, é que o debate proposto por Duailibi se resume a acusar a prefeitura de prejudicar a paisagem urbana com o grafite. Mas para acreditar que o interesse em questão é mesmo a qualidade visual da cidade, eu teria que esquecer que, na época do prefeito Kassab (para que ninguém diga que estou aqui apenas defendendo a prefeitura petista) um dos segmentos que mais ferozmente se opôs à Lei Cidade Limpa e sua intenção de extinguir os outdoors foi precisamente o da propaganda e publicidade. Ao que parece, o problema não é de fato o que impacte a paisagem urbana, nem a falta de transparência nas decisões a respeito, mas apenas o fato de que isso seja feito sem beneficiá-lo de nenhuma forma.
De resto, São Paulo há muito é uma "capital do grafite", reconhecida internacionalmente. Que o digam artistas como Eduardo Kobra, Alexandre Orion ou Osgemeos. Suas obras são requisitadas em diversas outras cidades do mundo, e o interesse no grafite paulistano já suscitou até o desenvolvimento de roteiros e aplicativos para mapeamento dessas obras de arte. Prefiro conviver com o grafite do que com a publicidade no espaço urbano. Quem quiser comparar, veja as imagens:
Anúncios publicitários ao longo do Minhocão
Fonte: PubADdict
Painel de Eduardo Kobra em homenagem a Oscar Niemeyer, na avenida Paulista
Fonte: Uhull

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Planejamento urbano e regional na internet - algumas fontes brasileiras

Um post rápido, apenas para listar algumas fontes de pesquisa de artigos e estudos acadêmicos na área de Planejamento Urbano e Regional:

  1. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais (RBEUR). Publicação da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional: http://anpur.org.br/revistas
  2. Metrodata. Bancos de dados com informações socioeconômicas e indicadores de análise social produzidos e desenvolvidos pelo Observatório das Metrópoles e por outras instituições: http://observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_content&view=article&id=152&Itemid=73
  3. Revista Cadernos Metrópole. Publicação do Observatório das Metrópoles, tem como principal objetivo difundir os resultados da análise comparativa entre as metrópoles brasileiras: http://www.cadernosmetropole.net/ 
  4. eMetropolis. Revista Eletrônica de Estudos Urbanos e Regionais: http://www.emetropolis.net/
  5. Urbe. A revista eletrônica da PUC do Paraná, dedicada à discussão de diversos assuntos e pontos de vista relacionados às questões urbanas em geral, e à gestão urbana em específico: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issues&pid=2175-3369&lng=pt&nrm=iso
Boa leitura!

Estatuto da Metrópole: um resumo

No dia 12/1/2015 foi sancionada a Lei Nº 13.089, que institui o chamado Estatuto da Metrópole, alterando alguns dispositivos da Lei no 10.257/2001 (o Estatuto das Cidades), e dá outras providências.
A lei é estruturada em seis capítulos: (I) Disposições Preliminares; (II) Da Instituição de Regiões Metropolitanas e de Aglomerações Urbanas; (III) Da Governança Interfederativa de Regiões Metropolitanas e de Aglomerações Urbanas; (IV) Dos Instrumentos de Desenvolvimento Urbano Integrado; (V) Da Atuação da União e (VI) Disposições Finais.
No Capítulo I (Disposições Preliminares) são apresentados (Art. 1º) os princípios gerais – no que consiste, objetivos e âmbito de aplicação (Regiões Metropolitanas[1], Aglomerações Urbanas e Microrregiões instituídas pelos Estados) – e também as definições fundamentais utilizadas pela Lei (Art. 2º), ou seja:
  • Aglomeração urbana: unidade territorial urbana constituída pelo agrupamento de 2 (dois) ou mais municípios limítrofes, caracterizada por complementaridade funcional e integração das dinâmicas geográficas, ambientais, políticas e socioeconômicas; 
  • Função pública de interesse comum: política pública ou ação nela inserida cuja realização por parte de um Município, isoladamente, seja inviável ou cause impacto em Municípios limítrofes;
  • Gestão Plena: condição de região metropolitana ou de aglomeração urbana que possui: formalização e delimitação mediante lei complementar estadual; estrutura de governança interfederativa própria, nos termos do art. 8o desta Lei; e Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado aprovado mediante lei estadual;
  • Governança Interfederativa: compartilhamento de responsabilidades e ações entre entes da Federação em termos de organização, planejamento e execução de funções públicas de interesse comum; 
  • Metrópole: espaço urbano com continuidade territorial que, em razão de sua população e relevância política e socioeconômica, tem influência nacional ou sobre uma região que configure, no mínimo, a área de influência de uma capital regional, conforme os critérios adotados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE[2]
  • Região Metropolitana: aglomeração urbana que configure uma metrópole;
  • Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado: instrumento que estabelece, com base em processo permanente de planejamento, as diretrizes para o desenvolvimento urbano da Região Metropolitana ou da Aglomeração Urbana; 
A instituição de Regiões Metropolitanas e de Aglomerações Urbanas (Capítulo II) é atribuição conferida aos Estados (Art. 3º), mas a governança dessas áreas deve incluir, de forma interfederativa, também os municípios que integrarem essas regiões. Quando uma Região Metropolitana ou Aglomeração Urbana envolver municípios de mais de um Estado, deve ser aprovada lei complementar em cada um dos Estados envolvidos (Art. 4º). Essas leis devem ter conteúdos mínimos, conforme definido no Art. 5º:
  1. Municípios que integram a unidade territorial urbana; 
  2. As funções públicas de interesse comum que justificam sua instituição; 
  3. A estrutura de governança interfederativa, incluindo a organização administrativa e o sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas; e 
  4. Os meios de controle social da organização, do planejamento e da execução de funções públicas de interesse comum. 
O Capítulo III, que trata da governança interfederativa, estabelece seus princípios fundamentais (Art. 6º[3]) e diretrizes específicas (Art. 7º). Nesses artigos, destaca-se a complementaridade estabelecida com o Estatuto da Cidade (Lei no 10.257/2001), especialmente no que diz respeito à gestão democrática das cidades. Nas diretrizes específicas, são estabelecidas obrigações para a governança interfederativa, que incluem a implantação de processo permanente e compartilhado de planejamento e de tomada de decisão; o estabelecimento de meios compartilhados de organização administrativa; o estabelecimento de sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas; a execução compartilhada das funções públicas de interesse comum, mediante rateio de custos; a participação de representantes da sociedade civil nos processos de planejamento e de tomada de decisão, no acompanhamento da prestação de serviços e na realização de obras afetas às funções públicas de interesse comum; compatibilização dos planos plurianuais, leis de diretrizes orçamentárias e orçamentos anuais dos entes envolvidos na governança interfederativa; e a compensação por serviços ambientais ou outros serviços prestados pelo Município à unidade territorial urbana. Essas diretrizes, além de reforçar o caráter democrático da gestão urbano-regional, tem efeito condicionador das políticas municipais (e das estaduais em relação a esses territórios), especialmente por vincular receitas e o planejamento orçamentário das entidades que compõem a unidade territorial. A estrutura básica da governança interfederativa das regiões metropolitanas e das aglomerações urbanas compreenderá em sua estrutura básica é descrita no Artigo 8º (instância executiva composta pelos representantes do Poder Executivo dos entes federativos integrantes; instância colegiada deliberativa com representação da sociedade civil; organização pública com funções técnico-consultivas; e sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas).
Os instrumentos de desenvolvimento urbano integrado são objeto do Capítulo IV, e incluem os seguintes (podendo haver outros, e sem prejuízo dos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade):
  1. Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado; 
  2. Planos Setoriais Interfederativos; 
  3. Fundos Públicos;
  4. Operações Urbanas Consorciadas Interfederativas; 
  5. Zonas para aplicação compartilhada dos instrumentos urbanísticos previstos no Estatuto da Cidade; 
  6. Consórcios Públicos; 
  7. Convênios de Cooperação; 
  8. Contratos de Gestão; 
  9. Compensação por Serviços Ambientais ou outros serviços prestados pelo Município à unidade territorial urbana; 
  10. Parcerias Público-Privadas Interfederativas. 
Embora sejam elencados dez instrumentos, é o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (doravante citado pela sigla PDUI) que constitui o cerne da política metropolitana estabelecida por este Estatuto, sendo o único instrumento detalhado pela lei. No Art. 10 se define que o PDUI deve ser aprovado mediante lei estadual, não substituindo os Planos Diretores municipais, mas condicionando este à necessidade de compatibilização. O Art. 11 estabelece que, assim como os Planos Diretores municipais, o PDUI deverá ser revisto, pelo menos, a cada 10 (dez) anos. O conteúdo mínimo do PDUI é definido no Art. 12:
  1. Diretrizes para as funções públicas de interesse comum, incluindo projetos estratégicos e ações prioritárias para investimentos; 
  2. Macrozoneamento da unidade territorial urbana; 
  3. Diretrizes quanto à articulação dos Municípios no parcelamento, uso e ocupação no solo urbano; 
  4. Diretrizes quanto à articulação intersetorial das políticas públicas afetas à unidade territorial urbana;
  5. Delimitação das áreas com restrições à urbanização visando à proteção do patrimônio ambiental ou cultural, bem como das áreas sujeitas a controle especial pelo risco de desastres naturais, se existirem; e
  6. Sistema de acompanhamento e controle de suas disposições. 
A atuação da União (Capítulo V) consiste no apoio ao desenvolvimento urbano integrado, conforme diretrizes e objetivos do plano plurianual e outras leis orçamentárias (Art. 13), tendo como requisito que a unidade territorial urbana possua gestão plena (Art. 14 – vide definição no Art. 2º). Como atribuição específica da União, o Art. 16 estabelece a responsabilidade por ações voltadas à integração entre cidades gêmeas localizadas na faixa de fronteira com outros países, especialmente com relação à mobilidade urbana.
Dentre as disposições finais (Capítulo VI), é estabelecida a criação de um Sistema Nacional de Desenvolvimento Urbano – SNDU (Art. 20), que deverá contar com a participação da sociedade civil, e incluirá um subsistema de planejamento e informações metropolitanas, coordenado pela União e com a participação dos Governos estaduais e municipais, na forma do regulamento. Esse subsistema reunirá, preferencialmente de forma georreferenciada, dados estatísticos, cartográficos, ambientais, geológicos e outros relevantes para o planejamento, a gestão e a execução das funções públicas de interesse comum em regiões metropolitanas e em aglomerações urbanas.
O Art. 21 define as responsabilidades dos gestores públicos com relação à implantação das exigências previstas neste Estatuto, caracterizando como improbidade administrative a não observância de algumas dessas responsabilidades. Entre elas, a de elaborar e aprovar, no prazo de 3 (três) anos, o PDUI das regiões metropolitanas ou das aglomerações urbanas instituídas até a data de entrada em vigor desta Lei mediante lei complementar estadual. Conforme o Art. 23, os Municípios podem formalizar convênios de cooperação e constituir consórcios públicos, independentemente das disposições desta Lei. Por fim, a lei acrescenta um item ao Estatuto da Cidade (Art. 34A), que passa a vigorar com o seguinte texto:
“Art. 34A. Nas regiões metropolitanas ou nas aglomerações urbanas instituídas por lei complementar estadual, poderão ser realizadas operações urbanas consorciadas interfederativas, aprovadas por leis estaduais específicas.
O texto original do Estatuto da Metrópole pode ser acessado nos seguintes endereços eletrônicos:

[1] No Brasil, existem as seguintes regiões metropolitanas, até o presente: (Alagoas) RM de Maceió, RM do Agreste; (Amapá) RM de Macapá; (Amazonas) RM de Manaus; (Bahia) RM de Salvador; (Ceará) RM de Fortaleza, RM do Cariri; (Espírito Santo) RM de Vitória; (Goiás) RM de Goiânia; (Maranhão) RM de São Luís,
RM do Sudoeste Maranhense; (Mato Grosso) RM do Vale do Rio Cuiabá; (Minas Gerais) RM de Belo Horizonte,
RM do Vale do Aço; (Pará) RM de Belém; (Paraíba) RM de João Pessoa, RM de Campina Grande; (Paraná) RM de Curitiba, RM de Londrina, RM de Maringá; (Pernambuco) RM do Recife; (Rio de Janeiro) RM do Rio de Janeiro; (Rio Grande do Norte) RM de Natal; (Rio Grande do Sul) RM de Porto Alegre; (Santa Catarina) RM do Norte/Nordeste Catarinense, RM de Florianópolis, RM do Vale do Itajaí; (São Paulo) RM de São Paulo, RM de Campinas, RM da Baixada Santista; (Sergipe) RM de Aracaju.
[2] O IBGE define como Capital Regional os centros que, como as metrópoles, também se relacionam com o estrato superior da rede urbana. Com capacidade de gestão no nível imediatamente inferior ao das metrópoles, têm área de influência de âmbito regional, sendo referidas como destino, para um conjunto de atividades, por grande número de municípios. Este nível tem três subdivisões: Capital regional A (11 cidades, com medianas de 955 mil habitantes); Capital regional B (20 cidades, com medianas de 435 mil habitantes); Capital regional C (39 cidades com medianas de 250 mil habitantes).
[3] Tais como: prevalência do interesse comum sobre o local; compartilhamento de responsabilidades para a promoção do desenvolvimento urbano integrado; autonomia dos entes da Federação; observância das peculiaridades regionais e locais; efetividade no uso dos recursos públicos e busca do desenvolvimento sustentável.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Qual o melhor fim para o Minhocão?

[Prescrição ao leitor: este artigo não tem nenhuma pretensão acadêmica. É um texto de intervenção, uma opinião escrita. Muitos dos argumentos mereceriam maior desenvolvimento, e muitas afirmações deveriam ser acompanhadas de fontes e referências. Não o são porque isso tornaria o texto extenso demais para uma postagem de blog. Convido todos a deixarem seus comentários, e assim podemos levar a discussão adiante. Há muito o que debater, mas tenho muito mais a dizer em defesa do que proponho aqui do que permitiria este espaço.]
  1. Símbolo máximo do urbanismo rodoviarista de São Paulo (descontando-se o óbvio "Plano de Avenidas" de Prestes Maia, que de fato estabeleceu o modelo para tudo o que lhe seguiu), a via expressa denominada oficialmente Elevado Costa e Silva, ou simplesmente o "Minhocão", está com os dias contados. Pelo menos no que diz respeito à sua função original e primordial: o de servir de via expressa para os automóveis atravessarem a cidade de São Paulo entre as zonas Oeste e Leste, cruzando o Centro.
  2. Há muito tempo são conhecidos os impactos que a intervenção, executada pelo então prefeito Paulo Maluf (início dos anos 1970, auge dos "anos de chumbo" da ditadura civil-militar), provocou no entorno: depreciação dos imóveis lindeiros, esvaziamento da região, deterioração paisagística e aumento da insegurança embaixo do Elevado, em toda sua extensão. O ganho foi unicamente para o transporte automotivo individual (ônibus não circulam sobre o Minhocão). E, assim mesmo, essa única vantagem justificou sua permanência por quatro décadas: sabemos que os direitos dos automóveis são inquestionáveis nesta cidade.
  3. Eram. Nos últimos anos, a pressão de moradores dos prédios em volta do Minhocão garantiu-lhes o direito ao silêncio com a desativação do tráfego em horários de baixo fluxo: noites, fins de semana a partir de sábado à tarde... No mesmo contexto, cresceu uma articulação social em defesa de outros modos de transporte que não o automóvel particular: movimentos em defesa do transporte público, da bicicleta, entre os principais. E, há pouco mais de uma década, vem florescendo em São Paulo uma nova cultura que reivindica a recuperação e reocupação dos espaços públicos na cidade. Festividades de rua, desde o êxito da Virada Cultural até o crescimento dos desfiles de blocos de carnaval. A cidade parece desejar a retomada de espaços que haviam se convertido em áreas monofuncionais dedicadas apenas ao carro.
  4. É nesse quadro que ganha força a demanda pela desativação do Minhocão. No recém aprovado Plano Diretor, consta a diretriz de desativá-lo progressivamente, enquanto se decide sobre seu futuro. As alternativas postas: a demolição e a constituição de um parque suspenso, inspirado no High Line novaiorquino, ou na Promenade Plantée parisiense. Seria uma hipótese a ser avaliada, porém por razões ainda não muito claras, vem-se construindo um discurso que tenta fazer dessa possibilidade um consenso, uma unanimidade - que não existe, diga-se desde já. Políticos, empresários, ativistas, imprensa, subitamente se mostraram não apenas simpáticos à ideia de um parque suspenso no Minhocão, mas ativamente engajados em promover sua realização.
  5. A solução do parque esbarra em questões técnicas complicadas, a começar pelo próprio estado de deterioração da estrutura do Minhocão. Há quem diga que sua recuperação possa ser mais cara do que o também custoso processo de desmonte. Não seria um caso inédito: numerosos casos nos Estados Unidos (berço do rodoviarismo) têm demonstrado que o custo de manutenção dessas estruturas já é mais elevado do que sua demolição (e nem é preciso incluir nessa avaliação outras externalidades como a depreciação do valor imobiliário no seu entorno). Além disso, o projeto não resolve o problema urbanístico e social que é a área sob sua estrutura - escura, sufocada.
  6. Mas o mais estranho da maneira como o debate tem sido conduzido é a falsa polarização entre "progressistas" que desejam o parque e "retrógrados" que, supostamente, desejam que tudo permaneça como está. Sim, uma parcela ainda majoritária da população vê com desconfiança a desativação da via expressa e teme pelo impacto que isso terá no tráfego (ainda que, empiricamente, esteja-se demonstrando que muitas vezes o trânsito nas regiões restauradas até diminui). Mas opor-se ao parque não implica automaticamente defender o carro. Pelo contrário, clama-se pela remoção desta estrutura tão perniciosa para a cidade.
  7. Assim como se defende a realização de concursos de ideias para o parque (o que, a rigor, seria redundante, porque isso já foi feito), caberia igualmente um concurso de ideias para a resolução da paisagem urbana pós-Elevado naquela região. Se a demanda por um parque se mantiver, ele pode inclusive ser desenhado no lugar do Minhocão, e não sobre ele. Ideias há muitas, e gente competente para um projeto deste tipo não falta - aqui mesmo em São Paulo, para não dizer no resto do Brasil ou até internacionalmente, se isso for desejado.
  8. A proposta de um parque elevado só tem, de fato, uma vantagem real sobre todas as alternativas que requerem a demolição da via elevada: prazo. Sua implantação pode dar-se imediatamente, tão logo o tráfego de veículos seja interrompido. Isso é ótimo para quem já tem investido na área - aparentemente, o mercado imobiliário já está atento e atuante na área, e já se encontram anúncios de imóveis novos ou "retrofitados" que vendem a proximidade com o "futuro Parque Minhocão". É a esses interesses que serve a pressa em aprovar e implantar o parque suspenso. Os demais usuários das atividades de lazer no Minhocão estão sendo ludibriados com a ameaça de que, se isso não for feito, nada será. O imediatismo é uma vantagem para quem demonstra ceticismo em relação à nossa capacidade de realizar algo planejado em longo prazo.
  9. Mas será isso, de fato, uma vantagem? Não será, aqui, um caso do que a sabedoria popular define como "quem tem pressa come cru", ou "a pressa é inimiga da perfeição"? A melhor solução é preterida em favor da mais rápida? Em prol de uma solução imediata, perde-se a chance de realizar um projeto como São Paulo há muito não vê, algo capaz de reconfigurar a cidade, materializar novos paradigmas. Uma chance histórica que seria desperdiçada em favor de um arremedo, um remendo numa cicatriz que há muito sangra a cidade.
  10. "O parque já existe, só faltam as árvores", dizem. Não é verdade. Falta muito mais do que árvores: não há infraestrutura de apoio, não há pisos adequados, não há mobiliário... E tudo o que pode ser instalado ali caberia perfeitamente nos espaços livres que foram sacrificados ao carro com a construção do Minhocão.
  11. Por fim, há ainda os que defendem a demolição parcial. Que sobrevivessem trechos do Elevado para que se preservasse a "memória" desse equívoco. Como se isso fosse "ensinar" a população a não incorrer no mesmo erro outra vez. Mas que "memória" é essa que se quer preservar? Exemplos como os memoriais dedicados ao Holocausto ou aos regimes socialistas na Europa Oriental são sempre invocados, mas ao meu ver essa analogia é imprópria. O que é o Minhocão, senão apenas um equívoco urbanístico? A memória da ditadura está bem conservada em um museu como o Memorial da Resistência. A memória do rodoviarismo está mais que bem salvaguardada em todos os viadutos e avenidas de fundo de vale da cidade. A única coisa boa que o Elevado Costa e Silva produziu foi, de fato, sua alcunha. O "Parque Minhocão" não precisa ser suspenso, e se a população deseja um parque naquela região, que seja feito como se deve: no chão. 
  12. Respondendo, então, à questão proposta no título desta postagem, o melhor fim para o Minhocão é sua demolição integral, e a substituição da estrutura por uma ampla e profunda requalificação da área - das vias sob o Elevado, dos edifícios lindeiros, de todo o entorno imediato, e principalmente das áreas livres públicas (como a Praça Marechal Deodoro) que foram destruídas ou descaracterizadas pela estrutura suspensa. Restituir a cidade, retirar as sombras, respirar de novo: é isso que deve ser feito. O desejo já existe, só falta realizá-lo.