sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Cullenices por São Paulo

Querid@s leitores, por diversos motivos não consegui manter o blog durante os meses de novembro e parte de dezembro. Mas não queria terminar o ano sem ao menos mais uma postagem. Com ela, faço meus votos para um feliza ano de 2014.

Um dos clássicos do urbanismo na segunda metade do século XX, ainda muito lido e discutido nas faculdades, é o livro de Gordon Cullen, Paisagem Urbana. Entre as muitas e instigantes definições dadas por Cullen no livro, talvez a mais importante seja a noção de "visão serial", uma sucessão de perspectivas (visuais) que se obtem ao percorrer um caminho a passo constante. Essa sucessão traz uma série de mudanças de ambientação, com as mudanças correspondentes de estímulos sensoriais (e que não são, como se poderia esperar, apenas visuais): claro/escuro, fechado/aberto, além de outros, talvez mais "eruditos" ou que requeiram um olhar mais treinado.
Mas não há outra maneira de treinar o olhar que não olhar. Observar com calma e atenção, o que não se faz no andar cotidiano que parece apenas conduzir de um ponto a outro, e faz do "meio" uma simples distância a vencer. As surpresas estão ali sempre, mas precisam ser notadas. E para isso é fundamental olhar com calma. Esse é talvez o exercício de urbanismo (e de urbanidade) que talvez mais precisemos fazer nos nossos dias: só assim deixaremos de sentir a cidade como uma ameaça, como feiúra, como artifício (no mau sentido da palavra - e aqui cabe uma lembrança do nome deste blog: artefato, obra de arte, requer alguma artificialidade, então não é a ausência de "natureza" o problema. Prometo retormar o assunto em outra ocasião).
Pois bem, o autor é inglês e ingleses são todos os seus exemplos. Mas, para a surpresa de muitos - não minha -, São Paulo é uma cidade pródiga em percursos que proporcionam perspectivas cambiantes e cenas estimulantes. Eu, que já gostava tanto deste aspecto da cidade, pude confirmá-lo este ano em aulas e discussões com alunos. São Paulo não é uma cidade fácil, nem óbvia. Suas belezas não são evidentes, há que descobri-las, e isso só é possível caminhando por suas ruas. E, neste sentido, o "caos" do Centro de São Paulo se presta maravilhosamente para essas descobertas.
Para comprovar o que estou dizendo, fiz um registro serial de um percurso realizado no centro de São Paulo no dia de hoje (27/12/13), por volta da hora do almoço, desde o viaduto Santa Ifigênia até o Largo São Francisco (clique aqui para ver as fotos). A sequência foi concebida de forma que o observador das fotos encontre sempre (com raras exceções, facilmente identificáveis) uma "âncora" que liga uma foto à seguinte: um edifício, um elemento de vegetação, uma rua, etc.
Para quem quiser, pode seguir as indicações do livro de Cullen, baixando-o a partir do link acima, e tentar identificar as características perceptíveis em cada cena. Ou então, pode apenas tentar identificar suas próprias percepções a cada parada, ou ainda tentar reconhecer lugares que conheça. Enfim, a série, como a cidade, presta-se a múltiplos usos. E, se quiser compartilhar conosco suas impressões ou experiências, fique à vontade! :)
Fico aqui com o que deverá ser, provavelmente, o último post do ano. Prometo me empenhar por mantê-lo ao menos com regularidade no próximo ano (a frequência não sei qual será, mas que ao menos se mantenha razoavelmente constante). Agradeço muito aos que acompanharam estes posts, seus comentários e incentivo. E desejo que 2014 seja repleto de descobertas e andanças pela cidade (seja São Paulo ou qualquer outra onde viva)!